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29.10.2020 | Por: administrador

O alimento da vez

A cartela de ovos tem ganhado mais espaço no carrinho de compras do brasileiro. Os dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) apontam que, de 2019 para 2020, o consumo per capita deve subir de 230 para 250 unidades por habitante (em 2007, era de apenas 120 unidades por brasileiro). De acordo com os especialistas no setor, esse aumento de 8,5% no consumo, em relação ao ano passado, não pode ser atribuído, exclusivamente, à perda de renda ocasionada pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19) e às oscilações no preço da carne, mas sim à versatilidade do alimento e aos benefícios que o consumo frequente de ovos proporciona à saúde.

Para o presidente da ABPA, Ricardo Santin, a produção de ovos nacional está crescendo e acompanhando o ritmo do consumo. "O Brasil alcançará, nesse ano, a marca recorde de 53 bilhões de unidades produzidas", indica o executivo. A quantidade é 7% superior ao volume contabilizado no ano anterior. Significa que 145 milhões de ovos estão sendo produzidos por dia, ou seja, cem mil por minuto e 1.680 unidades por segundo. "O ovo se mostrou uma excelente opção para substituir as proteínas de preços mais elevados. Deixou de ser um mero componente da mesa, passando a ser o prato principal no dia a dia do brasileiro", resume o presidente da ABPA.

Na opinião do gerente comercial de vendas de ovos da Korin Agropecuária, Marcelo Henrique Azevedo, a pandemia contribuiu para o aumento do consumo de maneira geral, não apenas na linha de ovos orgânicos e sustentáveis. "Tanto que fomos surpreendidos e não fomos capazes de suprir a procura nos primeiros momentos da pandemia, mesmo já tendo previsto um aumento de produção e de venda referente a 2019", comenta. No ano passado, a empresa produziu 30 milhões de ovos e só no primeiro semestre deste, elevou sua produção para 19 milhões de ovos. 

Desafios e perspectivas

Em Goiás, a produtora Inês Marasca, proprietária da granja Ovos da Mata, no município de Montividiu, acredita que o consumo vem aumentando gradativamente. Inês está na atividade há 20 anos e não atribui o crescimento da demanda apenas aos reflexos econômicos da Covid-19. Ela começou a se dedicar à avicultura nos anos 2000, quando ficou viúva. "Meu intuito era criar meu casal de filhos", fala.  Apaixonada pela atividade, Inês conta que a granja começou com mil galinhas poedeiras e hoje possui oito mil animais. A produtora aumentou o aviário com recursos do Fundo de Financiamento do Centro-Oeste (FCO Rural). Segundo ela, a renda da granja é fundamental para a família e Inês orgulha de ter contribuído para que a filha, Indiamara, tenha se tornado uma engenheira agrônoma de sucesso.

A Ovos da Mata produz, atualmente, 20 caixas de ovos por dia, o que equivale a 600 dúzias diariamente. A produção é comercializada em atacado e entregam em supermercados, restaurantes e pit-dogs dos municípios de Montividiu, Paraúna e Rio Verde. Inês destaca que, diferente do que parece, fazer o negócio prosperar não foi uma tarefa fácil. "São muitos desafios. O preço do ovo oscila muito e, às vezes, o valor chega a ficar muito baixo, enquanto o valor do milho e do farelo de soja sobem. Daí o lucro é pouco", avalia. "Não pode é desanimar", comenta a empreendedora. Inês prefere a vida no campo. Ela cuida de perto da alimentação das aves, da limpeza, do transporte e da coleta manual dos ovos para evitar qualquer perda.

Mãe e filha falam da importância de priorizar o bem-estar dos animais e os insumos usados na ração. As produtoras também estão sempre atentas à limpeza dos comedores e bebedouros, à vacinação das aves, à temperatura e à claridade no aviário. Elas atribuem a qualidade dos ovos ao zelo pelo cuidado com as aves e à qualidade da ração usada. Para baixar os custos de produção, compram o farelo de soja em uma cooperativa. Nos planos das produtoras, em longo prazo, está a produção de ovos orgânicos. "Estamos estudando a aceitação deste produto por nosso público, a fim de entender se os custos específicos deste sistema de produção terão valor agregado para os consumidores dos produtos da nossa granja", relata. 

O analista de mercado do Instituto para o Fortalecimento da Agropecuária de Goiás (Ifag), Marcelo Penha, concorda com Inês em relação aos custos e diz que gasto com alimentação das galinhas poedeiras onerou o bolso dos produtores nos últimos meses. Penha explica que, em média, 59% dos custos de produção do ovo são gastos com ração e como o valor pago pelo milho e o farelo de soja estão atrelados ao dólar, quando o preço destas matérias-primas essenciais sobe, o produtor perde poder aquisitivo, porque, em geral, não consegue repassar este ônus para o consumidor. Um estudo feito por especialistas disponível no portal Avisite (avisite.com.br) mostra que, feitas as contas, o produtor de ovos encerrou o primeiro semestre de 2020 necessitando de um volume de produto quase 23% maior para adquirir a mesma quantidade de farelo de soja obtida em junho de 2019. 

Outro fator que interfere no setor de produção de ovos para consumo, segundo especialistas, é a perda considerável do produto ao longo de todo o processo, desde a coleta dos ovos nos galpões até a entrega nos estabelecimentos de vendas. O problema está relacionado a quebras e trincas da casca. Segundo estes profissionais, quanto mais velha a ave, pior é a absorção e aproveitamento de nutrientes pelo trato gastrointestinal. Além disso, o peso do ovo aumenta, porém, a deposição de cálcio não, ou seja, há produção de ovos maiores com cascas mais finas, e assim a qualidade do mesmo, tanto interna quanto externa, é menor.

Soluções e mercado

Uma solução para superar o custo com o milho e o farelo de soja na propriedade de Maria do Rosário de Sousa foi a introdução do milheto e do sorgo produzidos no local. Ela e a cunhada Ana Maria Leandro Lopes moram na Fazenda Recantilado, em Piracanjuba. Trabalham com 60 galinhas poedeiras e comercializam de 10 a 12 dúzias semanais de ovos. Os clientes são assíduos e as produtoras estão começando a empreender com a entrega de ovos, em sistema delivery, para pedidos feitos por meio do Facebook e do Whatsapp. O filho Elisvan é técnico de campo de um laticínio e ajuda a mãe a dinamizar suas vendas. 

Rosário também é apaixonada pela vida no campo e planeja se capacitar para investir em piquetes e ampliar a produção. A empreendedora garante que nunca sobra ovo e que o diferencial dos seus produtos é a ração das galinhas produzida artesanalmente com o milho, o milheto e o sorgo, plantados e triturados na própria propriedade, adicionando apenas um concentrado à base de soja. As galinhas são criadas livres no quintal, que também dispõe de pasto. "A rotina aqui começa cedo com a limpeza cuidadosa dos galinheiros e a alimentação das poedeiras", explica. Rosário diz que o ovo caipira agrada todas as classes e bolsos. "É um alimento nutritivo e acessível. Tenho clientes que vem de Goiânia para buscar ovos e frangos caipira conosco", comemora.

Goiás é o sexto maior produtor nacional de ovos, segundo o analista de mercado do Ifag, Marcelo Penha. Ele aponta que a produção goiana representa 6,5% do volume nacional, de acordo com o levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a partir do número de galinhas poedeiras por estado e a quantidade de ovos produzidos por trimestre. Segundo o IBGE, os aviários goianos produziram mais de 104 milhões de dúzias de ovos de janeiro a junho deste ano. Três municípios se destacam: Leopoldo de Bulhões (sede da Granja Josidith), Inhumas (sede da Gaasa e a da Uniovo) e Hidrolândia (onde está instalada a Granja Loyola).

Apesar de o mercado doméstico estar aquecido, a avicultura de postura brasileira também está alçando voos mais distantes. De acordo com o presidente da ABPA, Ricardo Santin, o setor está de olho nas boas oportunidades para exportação do produto, tanto in natura, pasteurizado, em pó ou com ômega-3. Ele afirma que só em 2019, o Brasil exportou mais de 7,69 mil toneladas de ovos. Os principais destinos foram Arábia Saudita, Emirados Árabes, Japão, Uruguai, Barein, Cuba e Libéria. Ricardo diz, no entanto, que as exportações devem reduzir em até 54% em 2020, para atender a elevação do consumo interno.

De acordo com o instrutor do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar Goiás), Gustavo Milanez, apesar de alguns pequenos produtores de ovos ainda terem dificuldades para se enquadrar às especificações técnicas exigidas na avicultura de postura, é necessário reforçar a importância de capacitações como a de avicultura básica oferecida pelo Senar. Gustavo informa que o curso dura apenas três dias e pode ajudar o produtor a entender as características das aves caipiras, a legislação existente e as adequações necessárias no manejo, entre outros aspectos fundamentais para aumentar a renda do produtor. Mais informações sobre o curso podem ser obtidas no Sindicato Rural e no portal sistemafaeg.com.br/senar/cursos-e-treinamentos. 

Novos nichos

Sintonizadas com o comportamento do consumidor, as indústrias também estão investindo na diversificação de seus produtos para atender nichos específicos, como o público que pratica treinos esportivos mais intensos. Com foco nos atletas e praticantes de atividades físicas, as linhas fit começam a ganhar espaço no mercado e prometem auxiliar o público que valoriza dietas ricas em proteínas, que fornecem energia de fácil digestão e colaboram para o aumento e recuperação da massa muscular pós-treino. 

Um exemplo são os ovos enriquecidos com nutrientes como o ácido graxo e o ômega-3, encontrado em peixes, que estão em alta entre as preferências do consumidor. Outro aspecto também valorizado pelo público é o bem-estar animal. Tanto que marcas como a Korin estão investindo na produção de ovos caipira da sua Linha Sustentável. Nesta linha, as galinhas não têm estresse e vivem sem necessidade de tomarem antibióticos, quimioterápicos ou coccidianos. A marca usa alimentação à base de grãos sem modificação genética (não transgênicos).  A produção é a primeira do Brasil a ser certificada com o selo de bem-estar animal emitido pela Certified Humane Brasil (HFAC), principal organização internacional voltada para a melhoria da vida das criações animais na produção de alimentos, do nascimento até o abate.

Consumo e benefícios

A relação dos benefícios do ovo para saúde humana é tão extensa quanto a quantidade de receitas diferentes de gemada disponível na internet e as segmentações técnicas usadas pela indústria para classificar os tipos de ovos e os sistemas de produção. Conforme ressalta a nutricionista Lúcia Endriukaite, do Instituto Ovos Brasil, está provado que o colesterol presente no ovo não aumenta a incidência de problemas cardiovasculares. Ela recomenda à população a buscar uma alimentação equilibrada, incluindo verduras, frutas, alimentos integrais e proteínas. Destaca, ainda, que o ovo é fundamental para a saúde nas diferentes faixas etárias. 

O ovo é versátil e prático. Para ela, vale lembrar sempre que a versão cozida é sempre mais saudável que a frita. Ela indica o consumo do ovo no final da tarde para quem deseja estar em paz com a balança. "Como intervalo entre almoço e o jantar é maior, é interessante consumir o ovo no final da tarde para dar uma saciedade maior e favorecer o emagrecimento", diz. Ela recomenda cozinhar o ovo por até no máximo 12 minutos, deixá-lo na casca e levar para o trabalho. Lúcia informa que a casca só deve ser retirada no momento do consumo. 

Clara ou Gema? A nutricionista diz que é importante comer o ovo inteiro para ter todos os nutrientes. A clara tem proteínas, já a gema, além das proteínas, conta com vitaminas e carotenoides que protegem a visão dos raios ultra-violeta e da degeneração macular relacionada a idade. Lúcia reforça, ainda, que o ovo contém a vitamina D (essencial para a imunidade em tempo de recolhimento social), além de ser uma fonte de selênio, gorduras polisaturadas e minerais.

Do ponto de vista do consumidor, é necessário checar a procedência do produto (precisa ter CNPJ, nome do produtor, data de produção e data de validade). Ela lembra que ovo, como todo alimento de origem animal, não pode estar sujo, trincado ou com fissura. "A casa tem cerca de 10 mil poros, responsáveis pela troca gasosa. Qualquer dano na casca representa possibilidade de contaminação".  O consumidor deve estar atento e ser cuidadoso e exigente. "O ovo deve ser o último a ir para o carrinho de compras. A validade máxima do produto sem refrigeração é de 10 dias. O ovo deve ser mantido em ambiente seco, arejado e sem odores".

 

TABELA

Ovos no Brasil

Ovos 2019 2020 Var. 2019/20

Produção 

(bilhões unidades) 49.055 53.000 +7%

Consumo per capita

(unidades/hab) 230 250 +8,5%

Exportação

(mil toneladas) 7.698 3.500 -54%

Fonte: ABPA; Secex.

Imagem: divulgação

Comunicação Sistema Faeg/Sistema

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